O sonho (do golpe) não acabou
Se os empolados senhores do STF têm dúvida sobre o que fazer, basta lembrar o exemplo de Nelson Hungria.
Palcos das manifestações pelo impeachment da presidenta Dilma Rousseff, ruas e avenidas de todas as capitais do País ficaram praticamente vazias no domingo 13. Esse resultado numérico, ao se levar em conta o minguado número divulgado pelos jornais, fontes insuspeitas no caso, em torno de 80 mil pessoas. Foram 350 mil na passeata anterior.
Surgiram várias interpretações para o retumbante fracasso. Há, porém, uma interpretação possivelmente especial. Talvez uma boa tradução política: a bolha do golpismo se desfez, estourada pela força da legalidade. Legalidade é uma referência fundamental, com lições aplicadas à esquerda e à direita, em dois outros importantes episódios de crise política na República.
Em 1961, após a renúncia do presidente Jânio Quadros, os comandantes militares das Três Forças tentaram golpear a Constituição, reagindo à posse do vice-presidente João Goulart. A criação de uma Rede da Legalidade comandada por Leonel Brizola, governador do Rio Grande do Sul, desfez com precisão o golpe em marcha. A esquerda neutralizou a direita, agindo em defesa da democracia.
Em 1964, entretanto, a bandeira da legalidade mudou de mãos. O discurso radical, apoiado numa suposta possibilidade de mobilização popular com forte viés de golpe – distante do que Goulart propunha e pensava –, empurrou a legalidade para os braços da direita. Muita gente dormiu de touca e muitos outros acordaram no exílio. Foram mais de 20 anos da ditadura civil-militar em cujo porão corria o sangue dos adversários. Torturas e crimes nefandos.
A força da bandeira da legalidade democrática tem segurado, até agora, os mais agudos ataques de uma oposição, leia-se Aécio Neves, inconsolada com a derrota nas eleições presidenciais em 2014. Isso significa um ano de bombardeios.
E como se manifestam às ruas?
O recuo dos manifestantes contra Dilma pode ter animado a volta dos militantes petistas às ruas. Comprovam isso as manifestações de quarta-feira 16 a favor de Dilma. Não se prevê, porém, a repetição das grandes manifestações de outrora. Os 12 anos de poder, até agora, trouxeram alegrias e desilusões. No caso das manifestações contra Dilma, como em 2015, há o fracasso da mais recente manifestação. Isso não abala necessariamente o projeto da oposição de chegar ao poder, via tapetão, após perder o jogo no gramado.
A judicialização da política jogou no colo de Têmis as mais importantes decisões sobre o percurso do pedido de impeachment contra Dilma. A deusa grega da Justiça estará, porém, submetida a uma observação astuta, e bem brasileira, do advogado Nelson Hungria (1891-1969), um dos poucos membros da advocacia brasileira capaz de ser condecorado com o grau de jurista.
Quando ainda se cobria com a toga de ministro do Supremo Tribunal Federal, Hungria lançou uma insuperável regra sobre o papel do STF: tem o privilégio de errar por último.
Jampa Web Jornal
Palcos das manifestações pelo impeachment da presidenta Dilma Rousseff, ruas e avenidas de todas as capitais do País ficaram praticamente vazias no domingo 13. Esse resultado numérico, ao se levar em conta o minguado número divulgado pelos jornais, fontes insuspeitas no caso, em torno de 80 mil pessoas. Foram 350 mil na passeata anterior.
Surgiram várias interpretações para o retumbante fracasso. Há, porém, uma interpretação possivelmente especial. Talvez uma boa tradução política: a bolha do golpismo se desfez, estourada pela força da legalidade. Legalidade é uma referência fundamental, com lições aplicadas à esquerda e à direita, em dois outros importantes episódios de crise política na República.
Em 1961, após a renúncia do presidente Jânio Quadros, os comandantes militares das Três Forças tentaram golpear a Constituição, reagindo à posse do vice-presidente João Goulart. A criação de uma Rede da Legalidade comandada por Leonel Brizola, governador do Rio Grande do Sul, desfez com precisão o golpe em marcha. A esquerda neutralizou a direita, agindo em defesa da democracia.
Em 1964, entretanto, a bandeira da legalidade mudou de mãos. O discurso radical, apoiado numa suposta possibilidade de mobilização popular com forte viés de golpe – distante do que Goulart propunha e pensava –, empurrou a legalidade para os braços da direita. Muita gente dormiu de touca e muitos outros acordaram no exílio. Foram mais de 20 anos da ditadura civil-militar em cujo porão corria o sangue dos adversários. Torturas e crimes nefandos.
Brizola
O Brizola de 1961 (Vanderlei Almeida/AFP)
A força da bandeira da legalidade democrática tem segurado, até agora, os mais agudos ataques de uma oposição, leia-se Aécio Neves, inconsolada com a derrota nas eleições presidenciais em 2014. Isso significa um ano de bombardeios.
E como se manifestam às ruas?
O recuo dos manifestantes contra Dilma pode ter animado a volta dos militantes petistas às ruas. Comprovam isso as manifestações de quarta-feira 16 a favor de Dilma. Não se prevê, porém, a repetição das grandes manifestações de outrora. Os 12 anos de poder, até agora, trouxeram alegrias e desilusões. No caso das manifestações contra Dilma, como em 2015, há o fracasso da mais recente manifestação. Isso não abala necessariamente o projeto da oposição de chegar ao poder, via tapetão, após perder o jogo no gramado.
A judicialização da política jogou no colo de Têmis as mais importantes decisões sobre o percurso do pedido de impeachment contra Dilma. A deusa grega da Justiça estará, porém, submetida a uma observação astuta, e bem brasileira, do advogado Nelson Hungria (1891-1969), um dos poucos membros da advocacia brasileira capaz de ser condecorado com o grau de jurista.
Quando ainda se cobria com a toga de ministro do Supremo Tribunal Federal, Hungria lançou uma insuperável regra sobre o papel do STF: tem o privilégio de errar por último.
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Mauricio Dias/C.C/Vanderlei Almeida/AFP/O Brizola de 1961 (Vanderlei Almeida/AFP)
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